quarta-feira, 24 de novembro de 2010

MONEY JUNKIES

Hoje, dia de greve, muitas opiniões se levantam e poucas pessoas se manifestam, pelo menos nas ruas. Não que seja apologista da violência, mas um país de brandos costumes só poderá resultar em brandas medidas. Ao ver as notícias fui percebendo que muitas pessoas não fizeram greve porque trabalham a recibos verdes, e um dia sem trabalhar significa um dia sem receber. Outros vão trabalhar porque estão a contrato e não querem perder os seus empregos e outros não fazem greve porque não têm um trabalho ao qual faltar (que é o meu caso).
O que me parece é que não há muita gente a perceber para que deve servir esta greve, chego a esta conclusão porque estas pessoas não fazem greve para não se prejudicarem amanhã, dia 25 de Novembro de 2010, para poderem ter dinheiro para comprar prendas de Natal, pagar a renda da casa e comprar um telemóvel de última geração que vão pagar a prestações. Estas pessoas não entenderam que a greve não é contra o seu patrão, mas sim contra aquilo que os governantes do seu país lhes fazem todos os dias: O IVA a 23% nas prendas de natal, os juros da prestação do telemóvel, a taxa de juro que terão de pagar pelo empréstimo da casa, ao banco salvo com o dinheiro dos seus impostos pelo seu governo eleito com a sua abstenção.
É em dia de greve que eu ouço muitos portugueses dizer na televisão que se sentem prejudicados pela greve, que devido ao encerramento da escola do filho ou à falta de transportes não puderam ir trabalhar, e que isso é altamente prejudicial, que o trabalho não pode parar! Mas na semana que vem quando for dia 1 de Dezembro (4ªfeira) não se irá de coibir de tirar a 2ª e a 3ªfeira de férias para ir até ao Algarve fazer um fim-de-semana prolongado, e com certeza a semana passada não se lamentou com a “ponte” que o governo deu por conta da Cimeira da Nato. O trabalho pode esperar…
Mas porque é que um ser humano do século XXI, que tem uma série de direitos que foram conquistados pelos seus antepassados, renuncia tão facilmente a eles? Porque é que se renuncia à greve? Porque se renuncia à manifestação de rua? Porque se renuncia ao direito de ser aumentado todos os anos? Existem muitas explicações, mas fundamentalmente penso que a sociedade é toda dependente de dinheiro. È uma dependência semelhante a qualquer outra dependência química. Os meus avós não precisavam de ter uma casa para viver e outra para irem de férias. Já estavam com sorte se tivessem uma casa para viver, mas conseguiram-na e não pediram empréstimo ao banco para a comprar (estou a falar de um pedreiro e de uma camponesa). Os meus pais tiveram durante ao maior parte das suas vidas um único carro para passear ao domingo e para ir de férias. Hoje cada membro do casal tem o seu carro e assim que os filhos fazem 18 anos passam a ter um carro para cada um, ou seja, uma família de 4 pessoas tem 4 carros, 4 seguros, 4 revisões, 4 chips para as portagens, 4 selos , e mais e mais.
Antigamente só havia uma televisão numa casa com 2 canais. Hoje cada divisão tem uma tv, com mais de 50 canais que ninguém vê mas que se paga. E todos têm de ser proprietários das suas casas. Nasceu a dependência dos empréstimos, porque toda a gente pensa que deve comprar uma casa, porque nos fizeram acreditar que isso é o mais acertado. É acertado para os fazer enriquecer. Foi criado o “ Kit da Felicidade” : Casa, carro, canudo e aparência. E estes quatro elementos têm várias gamas, desde a mais básica à mais elaborada. As pessoas começaram a medir-se de acordo com a gama do seu kit.
 Não se pode fazer greve quando se passou o ano inteiro a dar graxa ao patrão, de modo a que seja finalmente este o ano (desde que lá trabalha há tantos outros) que ele vai aumentar o ordenado, permitindo que possa finalmente comprar um carro novo porque o antigo já tem 6 anos.
Mas entre a preocupação em alcançar o Kit e pagá-lo, onde fica aquilo que se pensa em relação ao mesmo? Será que alguém parou para pensar porque é que este Kit os faz felizes? Não deve haver muita gente que o faça pela simples razão de que a dormência em que vivem não o permite. Esta é mais uma razão para não perceberem que fazer greve hoje é mais do que não ir trabalhar mas sim mostrar que têm peso na sociedade, que têm consideração pelos seus direitos. Será que os direitos conquistados no passado têm valor para a maior parte da sociedade actual? Vale mais ser inteligente ou rico? Vale mais ser honesto ou corrupto?
  A máquina do dinheiro espalha-se por todo o lado, até a cultura deixa de o ser para passar a ser indústria. Nos anos 60 e 70 quem eram as grandes estrelas da música? Serge Gainsbourg um reaccionário, um pensador. Sex Pistols que destruíram uma série de pré conceitos em relação à música, democratizando-a mas reagindo ao universo em seu redor, Pink Floyd, tantos… Quem são as estrelas da actualidade? Britney Spears, Beyonce, Lady Gaga. O que é que elas fazem? Abanam o rabo e mostram roupas. Toda a gente quer ser como elas, toda a gente quer a roupa. A cultura está a trabalhar na obtenção de uma parte do kit – a aparência. O cartão de crédito paga as extensões de cabelo, o botox, as roupas de marca e as que não são mas parecem. De uma forma ou de outra estamos todos dependentes do carro, da casa das férias, das roupas, todos nós fomos tomados por esta droga. Os cartéis estão lá sentados nas suas sedes megalómanas, nas bolsas de valores e nós continuamos a alimentá-los, viciados no seu próprio produto.
Será que isto vai parar? Quem serão as novas figuras históricas que irão mudar o mundo? A dormência dos governos e das políticas educativas não parecem ter a capacidade de criar seres inteligentes que consigam fazer progredir o mundo. Talvez um subsariano alheio a tudo isto? Quem nos vai inspirar?

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